Mesmo com 47% da população contrária, comissão do Senado acelera projeto em meio a articulações políticas e queda de braço liderada por Davi Alcolumbre
Por Redação | Amazônia Realidade
Brasília (DF) - A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, nesta quarta-feira (17), o projeto que reduz as penas dos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, medida que pode beneficiar diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A decisão foi tomada apesar da rejeição expressiva da opinião pública e expôs mais uma vez o distanciamento entre o Congresso Nacional e a vontade popular.
Levantamento da Genial/Quaest aponta que 47% dos brasileiros são contra a redução das penas, enquanto apenas 43% se dizem favoráveis. Ainda assim, a proposta avançou na CCJ por 17 votos a 7, em um movimento que contrariou a posição do Palácio do Planalto e evidenciou o fortalecimento da articulação política da oposição dentro do Senado.
Projeto avança contra o clamor das ruas
A votação ocorreu em ritmo acelerado e com pouca resistência efetiva dos aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já sinalizou a intenção de vetar integralmente o texto caso ele seja aprovado pelo plenário. A ausência de lideranças governistas durante momentos decisivos da sessão acabou abrindo caminho para a vitória da oposição.
O projeto vinha sendo discutido há meses, travado pela insistência de setores bolsonaristas em uma anistia total aos envolvidos nos ataques às sedes dos Três Poderes. O impasse foi superado quando esses grupos aceitaram flexibilizar a proposta, defendendo a redução das penas como alternativa viável para avançar a matéria.
“Não é o que queríamos, mas, dentro da correlação de forças, foi o possível”, admitiu o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN).
Benefício direto a Bolsonaro e risco institucional
Caso entre em vigor nos moldes aprovados pela CCJ, o projeto pode reduzir significativamente o tempo de prisão de Jair Bolsonaro. A estimativa é que o ex-presidente passe do regime fechado atual, que varia entre seis e oito anos, para algo entre dois anos e quatro meses e quatro anos e dois meses, dependendo da interpretação jurídica. A condenação total soma 27 anos e três meses de reclusão.
Durante a tramitação, senadores identificaram brechas que poderiam beneficiar condenados por crimes não relacionados diretamente aos atos de 8 de janeiro. O relator da proposta, Esperidião Amin (PP-SC), acatou uma emenda apresentada pelo senador Sergio Moro (União Brasil-PR) para restringir o alcance do texto. Amin classificou a alteração como um “ajuste redacional”, argumento estratégico para evitar que o projeto retornasse à Câmara dos Deputados.
Governistas, no entanto, sustentam que a mudança altera o mérito da proposta e, por isso, deveria reiniciar a tramitação. A CCJ, dominada pela oposição no momento da votação, rejeitou essa interpretação.
Ausência governista e articulação da oposição
Um dos pontos mais criticados da sessão foi a ausência de aliados do governo Lula no momento em que a CCJ decidiu classificar a alteração como redacional. O próprio presidente da comissão, Otto Alencar (PSD-BA), governista e crítico da proposta, lamentou publicamente o esvaziamento do campo governista.
“Estou vendo todos os líderes da oposição presentes. Não vejo líder do governo aqui para defender essa causa comigo”, afirmou.
Os líderes governistas Jaques Wagner (PT-BA) e Randolfe Rodrigues (PT-AP) participavam de uma reunião ministerial com o presidente Lula, enquanto o líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), acompanhou a sessão de forma remota.
Davi Alcolumbre, bastidores e disputa de poder
Nos bastidores, a aprovação do projeto também é vista como parte de uma queda de braço política envolvendo o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Parlamentares avaliam que o senador passou a “mexer os pauzinhos” com mais intensidade após a indicação do advogado-geral da União para a vaga deixada por Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal (STF), movimento que alterou o equilíbrio de forças entre Executivo e Legislativo.
A atuação conjunta de Alcolumbre com o ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que fez discurso favorável ao projeto na CCJ, reforçou o peso político da articulação. A proximidade entre ambos ampliou o constrangimento de senadores que cogitavam se posicionar contra a matéria.
Próximos passos e desgaste político
Com a aprovação na CCJ, o projeto segue agora para o plenário do Senado e pode ser votado ainda nesta quarta-feira. Caso seja aprovado sem alterações, segue para sanção presidencial ou veto. Se houver mudanças consideradas de mérito, retorna à Câmara dos Deputados.
A condução do processo, porém, já impõe um custo político ao Senado. Ao avançar sobre um tema sensível, ignorando pesquisas de opinião e acelerando a tramitação em meio a articulações de bastidores, a Casa reforça a percepção de afastamento da sociedade e reacende o debate sobre impunidade, democracia e respeito ao resultado das urnas.
Com informações ICL Notícias
Foto: Saulo Cruz/Agência Senado
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