“Se quisermos continuar sonhando, teremos que voltar para a floresta.” — Davi Kopenawa Yanomami
Por Dário Matos | Portal Amazônia Realidade
Manaus (AM) - Na manhã desta quarta-feira (21), o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) foi palco de uma edição especial dos Seminários da Amazônia 2025, com o tema: “Em defesa da floresta e do povo Yanomami no cenário de mudança climática (vingança da terra-mãe): um chamamento ao ativismo”.
O evento reuniu estudantes, pesquisadores e lideranças socioambientais para ouvir uma das vozes mais potentes da luta indígena no Brasil: o xamã e escritor Davi Kopenawa Yanomami.
Uma voz ancestral em defesa do planeta
Presidente da Hutukara Associação Yanomami, Davi é coautor do livro A Queda do Céu e símbolo mundial da resistência dos povos originários contra o garimpo ilegal, a destruição ambiental e o etnocídio. Sua fala, permeada por sabedoria ancestral e poesia, emocionou o público presente no auditório do INPA. “A minha universidade é a floresta. Foi nela que aprendi: andando, escutando, observando, vendo onde nasce e cresce cada ser.”
Kopenawa lembrou que as mudanças climáticas não são uma ameaça futura, mas uma crise em curso. Ele comparou a pandemia da Covid-19 ao desequilíbrio causado pela ação humana, e alertou que a devastação já afeta diretamente os povos da floresta.
“As mudanças climáticas já chegaram. O ser humano é água, floresta, caça, peixe. É fundamental preservar os povos originários — o meu povo Yanomami e os outros parentes indígenas do Brasil.”
Sonhar como forma de resistência
Durante sua fala, Davi compartilhou a importância dos sonhos como uma ponte espiritual entre os Yanomami e a floresta:
“Vocês, pessoas da cidade, sonham no chão. Nós, povos originários, amarro minha rede como uma antena, subo até as montanhas e viajo pelos sonhos dentro da floresta. Nos sonhos, encontro os shabiri — os encantados, os pajés, os curandeiros.”
Ele fez um apelo direto à nova geração: “Os seus pais e avós já foram destruidores. Mas vocês têm outra mentalidade. Estão aqui, me ouvindo falar do amor à floresta. Encontrei a Greta Thunberg, uma menina não indígena que luta contra invasores e mineradoras. Eu gostaria que os brasileiros fossem como ela — guerreiros e guerreiras dispostos a defender nossa floresta.”
Chamado à ação coletiva
Kopenawa não poupou críticas ao modelo capitalista destrutivo e às ações predatórias do Estado. Ele convocou o público a se engajar na defesa da Amazônia:
“Parem com o garimpo ilegal. Parem de abrir estradas nas terras indígenas. Vamos lutar juntos para tentar minimizar as mudanças climáticas. Peço a força de vocês — estudantes, pesquisadores — para nos ajudar a cuidar da Amazônia. Cobrem das autoridades leis fortes para respeitar a natureza. Eu vou continuar lutando para defender a grande alma da floresta.”
Ciência e ancestralidade: saberes que se complementam
Durante o evento, o diretor do INPA, Henrique Pereira, reforçou o papel da ciência em diálogo com os saberes tradicionais:
“A floresta que estudamos é também fruto da ancestralidade dos povos originários. Esse saber está guardado em pessoas como Davi. Temos políticas de inclusão de estudantes indígenas e de produção científica em parceria com os povos originários.”
“Nós somos o ambiente”
A educadora Maria das Graças Tupinambá, da Aliança Ecouniversidade e do Instituto Etno, reforçou a importância de nos reconhecermos como parte da natureza:
“O ser humano se separou, mas estamos todos juntos, integrados. Só defendemos aquilo que conhecemos, só amamos o que conhecemos. Precisamos nos conhecer mais como seres integrais para defender o que está em nós — não ao redor, mas dentro de nós.”
Diálogo para transformar
Aberto ao público, o seminário buscou fortalecer pontes entre ciência, espiritualidade, ativismo e saberes ancestrais. Em tempos de colapso ambiental e injustiças históricas, o chamado de Davi Kopenawa ecoa como um convite à reconexão com a Terra — e à ação coletiva para conservá-la.
Fotos: Dario Matos
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